Depois de
ver tantos cursos de oratória, pensei em oferecer um curso de escutatória, mas
desisti porque ninguém quer aprender a ouvir. Isso é complicado e sutil.
Não é
bastante ter ouvidos para ouvir o que é dito. É preciso, também, que haja silêncio
dentro da alma. Aí está o difícil.
Não
aguentamos ouvir o outro falar, sem logo dar um palpite melhor... Até nossas
desgraças tem que ser maiores!
Nossa
incapacidade de ouvir é a manifestação mais constante e sutil da nossa
arrogância e vaidade. No fundo, nós somos os mais bonitos... Os pianistas, por
exemplo, antes de iniciar um concerto, ficam em silêncio sentados diante do
piano, esvaziando a alma e expulsando todos os sentimentos estranhos.
Alguns
índios americanos usam o bastão da fala. Quem o empunha tem livre uso da
palavra, quando todos ouvem com atenção e fazem uma pausa antes do próximo
começar a falar. Falar em seguida seria uma grosseria e desconsideração. E não
basta o silêncio de fora. É preciso o silêncio dentro. Ausência de pensamentos.
E aí, quando se faz o silêncio dentro, a gente começa a ouvir coisas que não
ouvia. Eu comecei a ouvir!
No fundo do
mar – quem mergulha sabe – a boca fica fechada. Somos todos olhos e ouvidos.
Aí, livres dos ruídos do falatório e dos saberes da filosofia, ouvimos a
melodia que não havia... Que de tão linda nos faz chorar.
Para mim,
Deus é isto: a beleza que se ouve no silêncio.
Daí a
importância de saber ouvir os outros: a beleza mora lá também.
Comunhão –
comunicação verdadeira – é quando a beleza do outro e a beleza da gente se
juntam num contraponto.
Rubem Alves (15/09/1933 — 19/07/2014)