segunda-feira, 29 de abril de 2013

Singularidade


 Antigamente o mundo parecia bem mais simples; todo jovem era igual, os cidadãos adultos se encaixavam dentro de certos paradigmas razoáveis e todo velho era considerado inútil. Hoje, tudo mudou.
Temos os jovens das gerações X, Y e Z com características distintas. O mercado de trabalho, altamente complexo e com participação crescente da mulher também se transformou. E os idosos, da terceira (ou quarta) idade, ainda trabalham, dirigem, namoram, fazem sexo, velejam e postam mensagens como esta nos seus Blogs.
No Brasil dos anos setenta, quando nossa pirâmide populacional ainda apresentava base alargada e pico afilado, a população era dividida em três categorias: muitos jovens, adultos trabalhadores e poucos velhos. Hoje, a pirâmide assumiu a forma de mitra, com o estreitamento da base e o crescimento da terceira idade com muito mais exigências e potencialidade do que antes.
Somos sete bilhões de habitantes na espaçonave Terra, cada um diferente do outro, com nossas próprias personalidades, nossas crenças e nossas experiências. Não podemos ser aprisionados em categorias uniformes, apenas com base em critérios etários que ditam normas de expressão e relacionamento ultrapassados, desconsiderando toda a singularidade individual.
Como somos indivíduos, há uma lógica inteligente: somos singulares, cada um diferente do outro por nossa vivência, formação e personalidade. Singularidade é um ponto de mutação. Singularidade é o ponto onde todas as leis falham. Uma nova ordem, um novo equilíbrio emerge a partir da singularidade.
Pensar velhice hoje é romper paradigmas firmados apenas na cronologia do curso da vida e na atribuição de significados homogêneos a ela. Como bem diz o Prof. Mário Sérgio Cortella:  “Gente não fica velha. Quem fica velho é automóvel, geladeira e sapato. Gente fica pronta!”

segunda-feira, 8 de abril de 2013

Mudanças reavivam lembranças


“Jamais uma pessoa consegue se banhar no mesmo rio”; afirmava o filósofo com sabedoria.
Nada é permanente, tudo flui, tudo é passageiro, talvez com exceção da mudança que permanece. Estou atravessando mais uma fase, um fim/recomeço de mais um ciclo de vida, que se substitui e se completa como as estações do ano no tempo circular.
Após uma temporada de vinte anos, estamos deixando o nosso apartamento do Morumbi para morar em definitivo no Guarujá, SP. Foram quinze dias estafantes de contato com as nossas lembranças, descoberta de objetos inanimados impregnados de história que remetem a bons momentos e a outros nem tão bons assim, mas que no final valeram a pena.
Hoje, prestes a entregar as chaves, a nostalgia se faz presente no som cavo das nossas passadas que ecoam no nosso apartamento vazio. E, de maneira quase autônoma e sem nenhum controle, uma retrospectiva se descortina perante os olhos da mente.
Ontem, retornamos de Taubaté onde participamos da comemoração de Bodas de Prata da minha filha Letícia Maria e do Paulo Henrique, em bela e tocante cerimônia organizada pelas minhas netas Ana Amélia e Ana Beatriz. O meu amigo Padre Fred, que realizou o casamento há vinte e cinco anos, esteve presente para a renovação da bênção nupcial e a todos encantou com sua verve inteligente e espirituosa mesclando alegria e piedade, como sempre falando mais para os corações do que para as cabeças. Abraçar e rever amigos de infância, colegas de escola, gente que participou da primavera da minha vida foi emocionante. Quando minha filha fez o seu discurso de agradecimento, não pude conter as lágrimas mornas e saborosas que costumam ser mais frequentes no nosso outono.
Myrta, minha mulher, a custo consegue aceitar o bom senso e a racionalidade de um casal maduro deixar um apartamento de quase 300 m² no Morumbi, com todas as despesas inerentes, pelo conforto e aconchego da nossa casa de praia, agora transformada em residência permanente. Como ela postou no Facebook, ali estão sendo deixados ¾ da sua vida, na verdade ¹/3 da nossa história. Esse apartamento foi um sonho dela, acabado com detalhes por ela idealizados, como a mesa italiana de travertino com dez lugares, a coluna grega na divisória da sala de jantar, o enorme bar Fiorentino de 45°, onde quase tudo acontecia, o closet/escritório, a cama king size italiana, etc. Deixá-lo, para ela é deixar um pedaço de si. Ainda bem que não foi vendido, só alugado. Jantares, festas, recepções, formaturas, natais, breakfast antes do Pantanal, aqui ali aconteceu tudo isso e muito mais.
Ali vimos crescerem filhos e netos. Karina, que veio menina e decorou com estrelas no teto a sua suíte com cama de viúva. Cresceu, formou-se, viveu no exterior, morou em Floripa e São Roque. Casou-se com o André e mudou-se para sua casa nova na Granja Viana. Marcelo, menor ainda, formou-se engenheiro de alimentos, morou na Espanha, fez pós de Chefe de Cozinha Internacional e hoje é um empresário de sucesso e consultor renomado, graças aos próprios méritos e uma mãozinha da Ivana. Minha primeira neta, que primeiro usou a Jacuzzi num banho improvisado pelas circunstâncias, hoje é professora de dança no Colégio Dante Alighieri. Hoje, a caçula tem 6 anos.
Ali também viveram os pais da Myrta no final da vida, com todo o carinho da família.
Doamos fogão, sofás, centenas de livros, quadros, esteira, eletrônicos, material de expediente, roupas, utilidades domésticas e brinquedos acondicionados em quinze sacos de 100 litros cada um.
Se a Myrta está com quinze anos, eu me sinto com dezoito e muito feliz por me livrar de velharias que me acorrentavam a fantasmas do passado e concorriam para o mofo da alma. Foram muito bons os anos ali vividos, mas com a mudança sinto-me livre, jovem e animado para a nova fase que começa.  Como diz a minha filha: desaquenda !

Que venha a primavera da vida outra vez !

 

130408.b