sábado, 8 de janeiro de 2011

Da quadratura do círculo


Houve tempo em que não gostava dos sonhos. Uns pelos outros, eram angustiantes, mesmo quando não eram pesadelos. Com frequência, acordava com a terrível sensação de estar numa queda livre e com a boca seca, para falar o mínimo.
Ultimamente estou gostando de sonhar, e qualquer coisa serve. Descobri tardiamente que isso me transporta no tempo e no espaço, ao passado e ao futuro, vejo paisagens deslumbrantes e absurdas, convivo com pessoas que não mais existem, parentes, amigos e até mesmo desconhecidos, que, no sonho, se tornam parceiros.
Os sonhos fazem parte da história da humanidade e acabam por se tornar um meio para explicar o inexplicável desde as mais remotas origens, passando pela mitologia grega e continuando na cultura ocidental cristã.  Prometeu, Jacó, José do Egito, São José, a mulher de Pilatos, são exemplos de sonhadores literais. Também existem os que sonham acordados e fazem brotar novas ideias como Newton, Thomaz Edison, Santos Dumont, Luther King e Kennedy.  E ainda existem os que se dedicam à interpretação dos sonhos, como Freud, Jung, Kristeva, Mãe Salete e outros tantos.
Certa manhã, eu acordei intrigado com as cenas finais de um sonho que beirava o surrealismo. Meu papel era o de balconista na loja do meu pai. Um jovem surgiu com um desenho de um círculo mal feito a lápis num pedaço de papel, como se tivesse sido feita uma cópia ou um decalque da peça original. Mas o mais intrigante foi a forma como pedia o objeto desejado: “Me dá um quadrado!”
Após examinar melhor o modelo no papel e obter respostas esclarecedoras para a sua necessidade, descobri que o mesmo buscava uma borracha daquelas utilizadas para completar o acoplamento entre o motor elétrico e bomba de água, que, na verdade, tem quase a forma de uma estrela – uma peça circular com pontas quadradas, destinadas a absorver o impacto entre duas polias de metal.
O angustiante, no meu sonho, é que as pessoas iam chegando e se envolvendo emocionalmente na discussão e formando dois blocos antagônicos.  Uns defendiam que a peça era circular e outros achavam que era formada por quadrados.  A discussão cresceu e se estabeleceu um combate onde a violência nasceu com a naturalidade daqueles fanáticos que se julgam os paladinos da verdade e com vocação de messias.
Dois partidos se formaram, onde as pessoas passavam a aceitar pacificamente os seus postulados, sem se deterem numa análise racional para a busca de uma solução objetiva do impasse – quadrado x redondo.
Agora, bem acordado, gostaria de estabelecer um paralelo dessas imagens com a nossa rotina diária nas empresas. Quanto tempo e energia nós desperdiçamos ao aceitar pacificamente e defender de forma veemente as “verdades” deste ou daquele grupo, que em nada contribuem para os verdadeiros objetivos da empresa?  Não estará a nossa visão de trabalho em equipe sendo prejudicada por um corporativismo anacrônico e improdutivo?  Teremos a racionalidade para distinguir os verdadeiros valores, missão e objetivos da organização, daquilo que pode ser apenas sectarismo inconsequente e espírito de corpo (para não falar espírito de porco)?   Não estaremos, ainda que inconscientemente, defendendo a quadratura do círculo?

Bene

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