Antes de qualquer
outra coisa, vou avisando que sou ótima companhia de viagem. Não é que meus
companheiros digam isso para me agradar. É que aprendi que o tempo desfrutado
fora de casa, em qualquer lugar do país ou do mundo, é precioso demais: é raro
e é caro. Férias e dinheiro são coisas que não se desperdiçam arranjando
confusão, ficando emburrado, reclamando do frio ou do calor. Isso a gente
pode fazer em casa.
É em casa
também que cultivamos nossas mais desarrazoadas manias. Convém trancá-las numa
gaveta antes mesmo de fazer a mala quando se viaja acompanhado, a não ser que
se saiba muito bem como conciliá-las com o interesse dos outros. Se alguém, por
exemplo, não abre mão de corrida matinal, tem também de ver se esse costume não
obriga outros a esperar para começar o dia ou a desistir de um programa com
horário marcado. Quando as manias da gente tentam se impor a um grupo, o cartão
da boa companhia perde muitos pontos logo de saída.
Conheço
pessoas que não se importam em viajar. Preferem a solidão a correr riscos com
uma companhia chata. Talvez elas mesmas sejam muito maníacas e não suportem
desistir temporariamente de seus hábitos e costumes. Seja como for, sempre me
pergunto como será fazer refeições sem ter com quem discutir o cardápio e
mastigar a comida olhando para o vazio. Parece sem graça.
Viagens são
perfeitas quando um grupo reúne gente que gosta mais ou menos das mesmas coisas
e tem ritmos semelhantes para acordar, para caminhar, para comer ou para
gastar. Melhores companhias são aquelas que conciliam o próprio prazer com o
dos outros. São relaxadas, flexíveis, independentes. Contam boas histórias e
não se estressam à toa. Sabem que o melhor da viagem pode acontecer no que não
estava programado. Isso, claro não inclui pessoas complicadas em volta.
NEGÓCIOS, negócios...
Uma das maiores complicações em viagens em grupo é lidar com dinheiro. Há pessoas que fazem uma caixinha para os gastos de toda hora: a parada para o café, o taxi para a balada, os ingressos dos museus. Há outros que revezam espontaneamente a vez de pagar isto ou aquilo de modo que todo mundo abra a carteira em cotas parecidas ao longo da viagem.
Gente pão-dura
que passa o tempo com a calculadora na mão fazendo a conversão da moeda e
achando tudo caríssimo, deve ser evitada a todo custo. São pessoas insuportáveis
e em geral submetem todos a seus rigorosos critérios financeiros. Mas acontece
de um grupo incluir alguém com orçamento muito bem limitado. Quando se aceita
como companhia alguém nessa circunstância é preciso estar disposto a pagar a
ela alguns jantares ou noitadas. Do contrário não se iluda, vai pesar um clima
desagradável sobre o grupo.
Cortesias com
dinheiro. No entanto, devem ser procedidas de forma discreta. Gentilezas
financeiras podem se transformar em ressentimento e mágoa tanto da parte de
quem oferece como de quem recebe. Parece estranho? Pois já vi boas companhias
quebrarem a cara quando se excederam em generosidades. E também vi generosos
transmutados em cobradores implacáveis. Pessoas não são fáceis.
Problema
sério de viagens acompanhadas são as compras, esteja você com amigos ou com seu
amor. Muitas vezes a gente só percebe que se deu mal na hora em que aparece o
roteiro de lojas a serem visitadas. É conflito na certa se uma parte do grupo
ou um lado do casal detesta passar o tempo dentro de grandes magazines ou no
comércio de equipamentos eletrônicos.
Se você for
do tipo que só entra numa loja ao deparar com algo extraordinário – uma banca
de azeites na Toscana ou de temperos na Provence – precisa deixar isso bem
claro ao grupo antes da viagem. Para não atrapalhar os planos e compras dos
outros, a boa companhia parte para o seu próprio passeio e marca um horário num
ponto de encontro que disponha de wi-fi. Quem gosta de comprar sempre se atrasa
preenchendo o formulário para o tax-free.
CADA UM PARA
UM LADO
A boa
companhia é independente. Com o Google Maps na mão e três ou quatro lugares
planejados para visitar, o viajante acompanhado tem todo o direito de se
separar do grupo para se refugiar num canto qualquer de sua preferência. Se ele
estiver cercado de boas companhias, ninguém ficará chateado. Nem todo mundo
gosta de museus. Ou de andar a pé. Não é de gostar de fazer tudo junto o que
faz as companhias serem boas. Só más companhias não desgrudam jamais.
Bons
companheiros às vezes topam com alguém no grupo que não fala língua alguma. Num
caso desses, saibam eles que o monoglota vai colar nos mais desembaraçados para
fazer os pedidos no restaurante, à recepção de hotel, à balconista da farmácia.
Ninguém precisa ser fluente em inglês, francês ou croata para ser boa
companhia, basta conseguir se comunicar. Numa situação dessas, porém, não há
escapatória além de ajudar quem está desconfortável ou inseguro. Paciência não
tem jeito.
Bons
companheiros respeitam duas outras regrinhas importantes que, se descumpridas,
podem azedar o humor do grupo. A primeira é o cumprimento dos horários
combinados. Se todos acertaram de se encontrar às 8,30 h, para tomar o café
da manhã, não importa se é dia de lavar o cabelo. A boa companhia acorda mais
cedo e chega junto. Saiba que aqueles que esperam retardatários no saguão do
hotel sempre falam mal dos que demoram para descer, por mais que sejam bons
companheiros.
A outra
regrinha trata do tamanho da bagagem. Se companheiros vão dividir o
espaço no quarto de hotel, no apartamento alugado, no carro ou no trem, devem
lembrar de que, quanto mais leve, melhor a companhia. O ideal seria um volume,
além da bagagem de mão.
Existe uma
lei universal das viagens que vale tanto para os chatos como para os bons
companheiros: elas passam rápido demais. Quando a gente vê já está
rodando a chave na porta de casa e administrando a ansiedade com a próxima
fatura do cartão. Enquanto durar, a viagem com companhia tem de ser divertida e
descomplicada. Na volta, ao olhar para trás, a lembrança trará dias radiantes –
mesmo que tenha chovido sem parar.
Quando viajo,
em dupla ou em grupo, meu mantra é uma canção na voz de Gal Costa. Dizem os versos:
”Quando a gente está contente, tanto faz o quente, tanto faz o frio, tanto faz.
Quando a gente esta contente, nem pensar que está contente, a gente quer”.
Viajar é o
barato total, mesmo que custe caro !
Mônica Valdvogel
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